Por mais voltas que se dê pela internet (que é uma forma prática hoje em dia de “navegar” pelo mundo sem sair do lugar (dizem os experts) :( não vislumbramos as primeiras capas de vinil em que o grafismo tenha a ver com o erótico ou algo assim parecido. Tudo começou numa forma insípida e algo, diríamos nós agora, machista, de vender discos com mulheres insinuantes nas capas, tal como fizeram na década de 50 Jackie Gleason, Martin Denny e George Shearing Quintet. Quem por esta altura quebrou as regras foi a cantora afro-americana Faye Richmonde que, numa assentada, editou 3 álbuns em que não figurava nas capas (como era usual à época para os intérpretes de cor) mas sim beldades brancas, nuas e em posições provocantes como comprovam os álbuns "For Men Only", "Girlesque" e "A Little Spice" (este último com 2 diferentes capas à escolha, e, já agora, passando a publicidade, um desses discos está à venda no nosso site). Mas Faye Richmonde foi mais longe, não só com as capas mas igualmente com os títulos de algumas das suas canções, casos de "My Pussy Belongs To Daddy", "If You Can't Get Five, Take Two" e "What Long Hair On Your Pussy". Claro que foram temas banidos da rádio por mais que a cantora demonstrasse as suas qualidades vocais num registo em que são evidentes as influências das contemporâneas Sarah Vaughan e Doris Day. Infelizmente não viveu o suficiente para alcançar a notoriedade, ou coisa que se pareça, pois faleceu inesperadamente em 1959.

Quem começou por esta altura e deu cartas no género Easy Listeming, foi o saxofonista italiano Fausto Papetti. As suas capas tiveram tanto êxito por esse mundo fora que muitas das suas “Raccoltas” tiveram direito a capas exclusivas, e, outras dignamente censuradas que fizeram deste músico uma referência especial quando alguém olhava para uma imagem sexual dum disco e proferia sorrateiramente “uma capa à Pappetti!...”. Podemos vislumbrar algumas dessas capas únicas de países hispânicos nas imagens deste artigo, assim como outras capas de artistas e conjuntos sul-americanos que foram um pouco mais “longe” no seu erotismo. O certo é que Fausto Pappetti deixou escola (agora musicalmente falando) com vários os seguidores, casos de Gil Ventura, Herb Alpert, e mais recentemente Kenny G e Chris Botti.

Passando o Canal da Mancha, houve também quem seguisse as directrizes gráficas de Papetti para embalar umas colectâneas da música pop/rock e que se tornaram num marco da cultura pop europeia. Falamos pois da série de discos de vinil Top of The Pops, editados desde 1968 pela Hallmark Records e extinta nos inícios da década de 80. Quem também seguiu esta linha comercial de beldades a venderem o produto (de versões não originais) foi o músico sul-africano Dan Hill, famoso pela sua série “Sounds Electronic” (d’um e d’outro apresentamos também imagens).

 

 

 

 

Se do Easy Listening e seus derivados estamos por agora falados, o que nos diz o verdadeiro Rock ’n’ Roll quanto ao assunto? Neste aspecto a censura foi mais atenta e rigorosa, não deixando nada ao acaso. Ou trocavam as capas ou tapavam-nas. Assim aconteceu em 1968 com Jimi Hendrix e o duplo “Electric Ladyland” repleto de mulheres nuas. Solução: trocar a capa por uma imagem da face de Hendrix. Nesse ano John Lennon foi mais longe ao editar juntamente com Yoko Ono o álbum “Two Virgins”, onde aparecem nus a mostrarem os generosos atributos concedidos pela mãe-natureza. Solução: tapar a capa com um saco de papel deixando à mostra, num pequeno recorte, as caras do casal (com um certo respeito e pudor, mostramos apenas a contracapa, que não deixa porém de ser bem elucidativa).

A década de 70, ao contrário do que se esperava, não enveredou por este caminho do erotismo ao serviço do Rock, porventura já ciente das imprevisíveis consequências comerciais. No entanto houve sempre (e ainda bem) excepções, como foram exemplos os ingleses Roxy Music, o alemão Klaus Schulze e o francês Cerrone (caso pioneiro do erótico a roçar o kitsch, como podemos comprovar numa imagem de uma beldade deitada no topo dum frigorifico!).

Se a música e a própria arte gráfica precisavam de uma lufada de ar fresco, o movimento Punk foi o detonador das muitas alterações e liberdades criativas que aconteceram nas décadas de 80 e 90. Por vezes as ideias eram apenas como um “déja vu”, que o digam os alemães "Die Toten Hosen" que em 1994 com o registo “Reich & Sexy” fizeram um pastiche da capa original de “Electric Ladyland”. Já que falamos de germânicos, também devemos referir os velhinhos Scorpions que abalaram os preconceitos com os discos “Virgin Killer” em 1976 e “Animal Magnetism” em 1980.

Mas mais que todos, mais até que os Guns N' Roses com a censurada capa "Appetite for Destruction" em 1987, foi a estrela Madonna em 1992 com o picture-disc “Erótica”, um muito raro e cobiçado disco de colecionismo em que simula um felatio (ver imagem).

 

 

 

 

Deixando de parte estas ordinarices vindas de além-fronteiras, falemos um pouco da nossa pacatez quanto ao “sexo” implícito nas capas do vinil. Infelizmente, ou felizmente, pouco há a mencionar na década de 60, salvo outras informações em contrário, temos uma capa de 1965 assinada pelo conhecido fotógrafo portuense Fernando Aroso num EP em que o motivo tinha a ver com o já falado Fausto Papetti. Um trabalho de encomenda da Orfeu (editora dos álbuns do popular saxofonista) e, como tal, os motivos não se podiam desviar muito da atenção do habitual comprador. Sabemos que o local da sessão fotográfica foram as Piscinas Municipais de Leça e a modelo da capa foi a jovem actriz Henriqueta Maia. Uma atraente imagem que não perturbava a nossa moralidade, o que já não veio a acontecer em 1969 com um disco da etiqueta Estúdio. Na verdade era preciso vir para o país uma atriz italiana, Io Apoloni, para baralhar os nossos brandos costumes. Catorze anos mais tarde o grupo feminino Doce seguiu (por assim dizer) os “conselhos” de Io Apoloni para serem faladas com uma capa de um nudismo algo recatado mas eficaz quanto aos seus propósitos. De resto pouco mais sabemos…a não ser para um facto curioso da autora da capa do disco “Epopeia” da Filarmónica Fraude, a jovem artista Lídia Martinez, que, mau grado tanto trabalho de não querer ferir susceptibilidades quanto aos personagens e às figuras que aparecem na capa, teve no entanto a censura à perna pois assinou com a data, isto é, 69. Um escândalo! Claro, tudo se resolveu a bem da nação com a artista a assinar o seu trabalho mas sem referir o ano.

O pior (para nós o melhor) veio com o 25 de Abril de 1974 e os artistas a soltaram finalmente o seu poder criativo e uma certa libertinagem à mistura. Um cocktail que nem sempre funcionou na perfeição pois foram, na sua maioria, edições sem continuidade. Surgiram também novas etiquetas discográficas, casos da Etiqueta Erótica e das Edições Vitória. Da primeira, salvo informação em contrário, saíram 10 discos de 45rpm designados como “Erotismo Cantado (Não Aconselhável aos Que Ouvem Mal)” de que damos prova nas imagens, e, das Edições Vitória apuramos 7 discos intitulados de “Erotismo - Impróprio para Menores de 18 Anos”, dos quais exibimos por sua vez algumas capas. Neste tipo de edições, também para quem estava emigrado e fazia pela vida gravando discos para a comunidade, pensou logo em fazer o mesmo. Damos como exemplo o emigrante/músico José Sampaio que editou uns tantos discos de teor erótico (conforme imagens) na etiqueta discográfica parisiense “Disco Serenata”. Mas quanto a nós, teve o mérito de publicar um álbum a meias com um dos seus ídolos de sempre, o Quim Barreiros, com uma capa (finalmente) a “condizer” com o seu percurso artístico! Essa preciosidade (genuinamente kitsch) pode ser apreciada aqui, e, para quem estiver perdido no meio de tantas mulheres, ela está assinalada com a bandeira nacional! Não está assinalada com uma bandeira mas é fácil de detectar a imagem dum álbum (de fundo amarelo) da Ofir e assinada pelo fotógrafo nortenho João Sottomayor. É dos poucos discos do género e no formato LP que está assinado pelo autor (na contracapa) do qual temos conhecimento na década de 70. Não só apresentamos essa como uma outra da mesma série de álbuns “12 Top Hits” da Ofir em que as fotos são atribuídas à extinta Agência Apollo. De resto, como foi sempre apanágio por estas bandas, a maioria das capas de conteúdos eróticos  surgiram em disco de 45 rpm, e, destas, temos também alguns bons exemplos.

Se, sobre a temática deste artigo, muitos pontos ficam ainda por referir, nada melhor que ilustrar da melhor possível através das imagens, e, como tal, não faltam as capas de discos da Playboy, da cantora italiana Sabrina, dos filmes eróticos e de alguns artistas gráficos que exploraram este género como uma forma de arte.

 

 

 

 

Texto de: Francisco J. Fonseca

 

N.B.

Como é já norma nos nossos artigos, optou-se (na sua maioria) por imagens que existem em arquivo, de artigos já vendidos, outros ainda em stock. 
Quase todas elas foram retocadas digitalmente.